LITÍGIO. Autarquia perdeu o processo judicial com a concessionária por ter alterado em 2007 o contrato para baixar o preço. Só em juros são 12 milhões

A Câmara do Marco de Canaveses perdeu o litígio judicial com a Águas do Marco (AdM), empresa concessionária das redes públicas de água e saneamento. O último recurso, para o Tribunal Constitucional (TC), não foi aceite e o recurso para o Plenário do TC foi descartado pela defesa da autarquia por considerar que não teria nenhum ganho de causa. Como resultado, a Câmara vai ter de indemnizar a AdM numa verba que, “para já” (decorrem negociações), ultrapassa os 28 milhões de euros.
Em causa está a Modificação Unilateral do Contrato de Concessão (MUCC) levada a cabo em 2007 pela autarquia, à data liderada pelo social-democrata Manuel Moreira, que reduziu o valor das faturas a pagar pelos munícipes em 40 cêntimos por metro cúbico de água e saneamento após uma manifestação de contestação ao tarifário.
A ideia era pôr um travão às tarifas mais altas do país, constantes do contrato de concessão considerado como “criminoso”, afirma Nuno Cerejeira Namora, jurista da equipa de advogados que o município contratou por 200 mil euros para defender a Câmara. “É uma fotocópia de outros, estava intencionalmente desequilibrado para beneficiar os privados em detrimento do erário público”, acrescentou.

PS E PSD TROCAM CRÍTICAS. MUNÍCIPE EXORTA PRESIDENTE A DEMISSÃO POR INDECENTE E MÁ FIGURA
O advogado levou anteontem a má notícia do fim da litigância judicial “de surpresa” à reunião de Câmara, uma vez que o assunto não constava da ordem do dia. A presidente da Câmara, Cristina Vieira (PS), responsabiliza o PSD “por esta brutalidade” da dívida. O PSD responsabiliza o PS por faltar à promessa eleitoral, durante a qual alegou ter um pré-acordo com a concessionária, e lembrou que “o PSD tinha um pré-acordo com as Águas do Norte para resgatar a concessão”. O vereador do PS sem pelouro, Mário Magalhães, que chegou a liderar as negociações antes de ser destituído, responsabiliza Cristina Vieira “por em 2016 ter recusado um acordo de 16 milhões que havia negociado com a empresa”. A autarca, por intermédio do advogado, não desmentiu o vereador do PS, dizendo apenas que o acordo “nunca esteve fechado”.
No período reservado ao público da reunião da Câmara, o assunto voltou à baila por intermédio do munícipe Francisco Gil Mendes, ao pedir à presidente de Câmara para se demitir por “indecente e má figura” uma vez que “mentiu descaradamente aos marcuenses ao dizer que tinha um pré acordo” na campanha eleitoral. A autarca enquadrou a interpelação do munícipe como “campanha eleitoral e desse modo não lhe vou responder”, disse Cristina Vieira.
Em suma, o Município do Marco de Canaveses está condenado a pagar os 16 milhões de euros de compensação às AdM pela alteração do contrato decretada em 2009 pelo Tribunal Arbitral (que espoletou todo o processo), mais 4% de juros (9,8 milhões de euros). Uma outra parcela da conta de somar são os cerca de 893 mil euros em faturas de saneamento por liquidar de 2004, acrescidos de 7% de juros (1475 euros). Somadas as quatro parcelas da dívida/indemnização o total é de 28,2 milhões de euros.
Segundo a defesa da Câmara, existe a garantia da AdM que nos próximos dez meses não haverá a execução da sentença, o que dá à autarquia espaço de manobra para negociar uma redução do montante da dívida, diga-se, algo que não conseguiu nos últimos 16 anos de negociações.
16 ANOS DE IMPASSE
O contrato com as AdM entrou em vigor em maio de 2005, quando era presidente da Câmara Norberto Soares que assumira o cargo depois da renúncia de Avelino Ferreira Torres (que negociou o contrato de concessão), para se candidatar, em outubro desse ano, à autarquia de Amarante.
Após a vitória de Manuel Moreira, no Marco de Canaveses, em 2005, o seu Executivo depois de não conseguir renegociar o contrato com a empresa, em 2007, avançou com a MUCC de concessão, impondo às AdM uma diminuição de cerca de 30% nos valores cobrados. Em 2008, a empresa recorreu ao Tribunal Arbitral e ganhou o direito aos 16 milhões de indemnização. A confirmação chegou agora, 16 anos depois e mais 12 milhões em juros.